31/10/2020

PRIMEIROS PASSOS DE UM ESCRITOR.

 Um dia na sala de aula minha professora dona Dinah, abriu um livro de poesias e começou a explicar para os alunos o que eram, odes e rimas poéticas. Falou dos grandes mestres da poesia. Entre eles Machado de Assis. Castro Alves e outros. Explicou aos alunos como transformavam tudo em poesia, até uma vírgula era motivo para poetar. Explicou também aos alunos sobre as poesias românticas que falavam de amor, sonhos e esperança. A importância das rimas. Eu me interessei pelo assunto, e dona Dinah me vendo tão compenetrado na aula perguntou-me, se eu seria capaz de fazer um verso de quatro linhas naquele momento. Os outros alunos se espantaram quando assenti com cabeça dizendo sim.

      — Muito bem Carlinhos! Dou-lhe então, cinco minutos. Está bem! Novamente assenti com a cabeça em sinal de tudo bem. Compenetrado peguei o lápis, rabisquei o caderno, depois apaguei e tornei a escrever, e apaguei de novo escrevendo outra vez. Levantei a mão em sinal à professora dizendo estar pronta a poesia.

      — Muito bem Carlinhos! Então leia a sua poesia para a classe!

Levantei-me com o caderno nas mãos e de vós trêmula, iniciando a declamação da minha ode.

      — Vírgula! Um sinal curvo,

      na mesma linha da palavra!

      Que separa a frase!

      Como se fosse, uma trava!

Ouvi um burburinho geral na classe, alguns riram e outros ficaram admirados.                                                                                                

      — Muito bem Carlinhos! É um verso estilo Manuel Bandeira, que implantou no Brasil o modernismo poético. Disse a professora!

      Perguntei-lhe então o que era o modernismo poético.

      — Modernismo poético Carlinhos! É a poesia, que já não tem mais muitas rimas ou muito lirismo! É feita com um verso mais livre, com tendências para se poetar em torno de qualquer coisa ou mesmo, até um objeto. Assim como o teu verso da vírgula.  Quero dizer que a poesia já não é mais tão melosa, como antigamente e também já não se emprega mais aquele português arcaico.  Com o passar das aulas vou explicando tudo isso a vocês.

      A pequena ladeira era de terra batida, socada de pedras para não patinaram os pneus dos carros nos dias de chuva. Haviam poucas casas e muitos terrenos baldios.     Éramos a decima família a mudar-se para aquele fim de mundo. Nos sentíamos os colonizadores do local.

      Ali cresci e fiz do fim de mundo o meu paraíso. Numa das casas lembro bem morava dona Dinah! Minha professora. Mulher de pouca fala, devia ter seus trinta e poucos anos. Era bonita e tinha a juventude a flor da pele. Era a mãe do meu amiguinho Marcos.

      Dona Dinah era uma das poucas mulheres a ter um rádio em casa. As luzes eram de lampião, mas o rádio funcionava a bateria.

      Às vezes na parte da tarde eu ia brincar na casa do Marcos só para ouvir o rádio.

      LOCUTOR: - E vamos apresentar agora UM PIANO AO CAIR DA TARDE. Música e poesia para sua hora de paz do dia. - Era maravilhoso ouvir o piano tocar entremeado a poesia, aí eu chorava.

      LOCUTOR: - Sob o patrocínio de MELHORAL que é melhor e não faz mal. Apresentamos na voz da poetiza Ana Ramos!

       VERSOS DE AMOR.

      Aí vinha uma poesia na voz da mulher que declamava. Como se estivesse vivendo a cena. O piano entrava dando um verdadeiro teatro a poesia.

       Um dia dona Dinah me pegou chorando. Veio perguntar-me se eu havia brigado com Marcos, ou estava sentindo alguma dor. Envergonhado respondi-lhe que era por causa da poesia que eu acabara de ouvir.

      Ela me disse que o que eu sentia, tinha que passar para o papel. E que quando eu crescesse poderia ser poeta ou talvez escritor. Mas me alertou que eu nunca perdesse o encanto. Eu não sabia bem o que era isso. Mas até hoje quando escrevo lembro-me das palavras de dona Dinah.

      Com o passar do tempo e com minha maior frequência em seu quintal a severa, mas doce professora foi me mostrando no dia a dia e nos livros, tudo o que eu lhe perguntava sobre poesias e histórias que vinham nos livros.

      Às vezes eu escrevia coisas bonitas, mas achava-as tolas. Quando dona Dinah as lia já vinha com um lápis da ponta vermelha fazendo a correção e palpitando. Me explicando o que podia e o que não podia. Na realidade sou muito grato a ela pelo empenho de lapidar o meu futuro.

      Eu guardava todos os meus desenhos, papéis e rabiscos. Outras vezes eu ficava até mais tarde no quintal de dona Dinah. Escutando o que toda molecada adorava. JERONIMO O JUSTICEIRO DO SERTÃO. Depois vinha a HORA DO BRASIL um falatório enjoado que não acabava nunca. Algumas vezes escutei a novela O DIREITO DE NASCER.

      Por vezes escrevi poesias em verso livre ou rimado, depois ao lê-las eu imitava o locutor da rádio.

 

LOCUÇÃO

 

Amor menino.

  Amor moleque.

                                                            Amor divino.

                                                 Amor criança a escutar o galo na infância.

                                   Amor das brincadeiras e dos risos.

                    Das mulheres fofoqueiras

              A tagarelar no portão.

                                                        Amor de fantasia, de perder o olhar num sonho.

                                      Como a águia a planar na imensidão.

                                  A procurar no mundo, a esperança.

                                                      Onde o brinquedo da criança! É a imaginação.

 

      IMITANDO O LOCUTOR --- E sob o patrocínio de talco ROSS que refresca e suaviza! Despede-se este locutor que vos fala.                

     Carlos Alberto Paduan.

Nenhum comentário: