15/08/2020

Decima oitava parte do meu livro”OS DOIS AMORES DE CARLINHOS” QUEM ERA RUSSO


Por volta das dez da manhã, Carlinhos ouviu a vós do Russo no corredor, conversando com alguém e sorriu do escândalo que ele fazia, mesmo conversando normalmente. Perguntou a Ligia como ela havia conhecido Russo.                                                                                                               — Eu o conheci numa noite fria, num bar chamado Love Story, Eu trabalhava lá de garçonete. Ele chegou ofegante e ferido. Na penumbra do ambiente eu percebi e me cheguei a ele perguntando.

— Você está machucado companheiro!                  

— Nada sério me respondeu num inglês, meio atrapalhado. E continuamos falando inglês, cada um da sua maneira.                                                                        

— Me deixa olhar esse ferimento! Para ver o que dá para fazer.                                                                                                                                                                                                            — A única coisa que você pode fazer agora é me esconder!                                                                                        --- Se é assim venha comigo! Levei o para o banheiro feminino e o coloquei sentado no vaso sanitário ficando de guarda na porta.

— Ei moça? Você ainda esta ai!

— Sim!

— Veja se no bar tem um homem de boina preta! Essas de marinheiros russos, que tem um fio vermelho pendurado..

— Fui até o bar e vi um cara com uma boina daquela que ele tinha descrito, estava encostado no balcão bebendo alguma coisa. Voltei para avisá-lo e quando abri a porta do sanitário percebi uma mancha de sangue no chão. Russo estava sentado no vaso sanitário com a cabeça entre as pernas e quase encostada no chão. Acho que tinha desmaiado, rapidamente chamei por duas meninas minhas amigas e conseguimos arrastá-lo para a porta dos fundos do bar.

— Quase na rua, demos de cara com outro, boina preta e tornamos a arrastar o Russo para dentro do bar novamente. Coloquei-o então, embaixo da escadaria que levava ao escritório da gerência. Ali era um armário de vassouras, pedi a uma das meninas que limpasse o sangue que ficara marcado no corredor e fui logo abrindo a camisa do cara, procurando por algum ferimento. Achei um pequeno furo que pelo jeito fora feito por objeto bem afiado e pontudo.

— Amor! Você quer mais café! Perguntou Ligia à Carlinhos interrompendo o relato.

— Agora não! Quero ouvir o resto dessa história.

— Acenda para mim apenas um cigarro que está do teu lado.

Ela voltou a deitar no peito amado e continuou sua narrativa.

— Joguei pinga, que achei no armário e que devia se do faxineiro, no ferimento do russo. Ele gemeu de dor, dei a garrafa na mão dele e o cobri, com sua própria camisa. Depois me dirigi ao bar, conversei com um copa amigo meu, que em pouco tempo me trouxe umas bandagens e um vidro de mertiolate.  Fiz um curativo limpando o sangue e enfaixando, dei mais cachaça a ele. Que logo dormiu.

— Voltei ao salão e fiquei esperando até que o homem de boina preta fosse embora. Voltei ao lugar onde estava o moribundo acordei-o, e o levei para o hotel General, onde eu estava hospedada. Quando acordou, já bem à tardinha levei-o, para a Santa Casa de Santos e lá cuidaram dele que ficou internado por mais três dias.

–-- Você salvou a vida dele amor! Disse Carlinhos!

 --- Não sei se salvei ou não o que sei é quem não podia ter deixado uma pessoa sangrar daquele jeito só porque eu não há conhecia.                                                                                                                     – E de onde é o Russo

— Ele me disse que nasceu num lugar chamado Belarus, que fica na União Soviética!

— Eta você hein! Coraçãozinho de ouro! E agora eu quero um café.

— Tá bom amor! Está tão gostoso aqui, que eu não quero me levantar! 

— Vai levantar sim preguiçosa! Disse Carlinhos fazendo-lhe cocegas. Ela desceu e foi buscar mais café, quando voltou, ele já havia colocado a roupa.

— Aaaaah amor! Aonde vai!

— Trabalhar? Menina!

— Volta logo! Tesouro.

— Volto!

— E dorme comigo!

— Não! Fico acordado!

— Tolinho!

Carlinhos beijou Ligia por longo tempo e saiu. Já no saguão do café encontrou Russo e rumaram para o armazém 22 onde estava atracado o navio Amsterdã.                                                          

Durante o trajeto Carlinhos havia perguntado ao amigo o que ele fazia no Brasil.

— Interessa a você saber disso.

— Sim! É que Ligia me contou como te conheceu!                                                

— Ah! Ligia! Se não fosse Ligia eu não estaria aqui conversando contigo amigo. Outro dia te conto isso e porque estou nesta terra maravilhosa. Agora não quero lembrar nada quero apenas trabalhar. Disse Russo.               

O dia foi cansativo para os estivadores do navio as sacas de café não paravam de chegar. Carlinhos e Russo terminaram a tarefa do turno e foram se lavar. Depois de limpos e já andando na direção do hotel, russo resolveu contar porque estava no Brasil.

— Olha amigo vou te contar porque fiz do Brasil a minha pátria! Eu nasci em Belarus um pequeno pais que faz parte da União Soviética. Eu era embarcado no navio Stalin, era o primeiro imediato, tinha chances de ser um futuro capitão, mas nunca chegaria a esse posto. Nunca dei bola para politica e principalmente para comunismo e suas imposições. Um salário um pouco melhor que os demais, mas uma boa vida, muita severidade e nenhuma liberdade, trabalho mais de doze horas por dia e poucas folgas, pouco estar com a família.

 



Conheço todos os portos do mundo. Conheço todos os bares de todos os cais do mundo e todas as prostitutas e mundanas, traficantes e contrabandistas.

— Nunca tive liberdade, nunca fui dono da minha escova de dente e todas as vezes que comprava um palito de dentes era obrigado a relatar ao meu comandante. Todos os presentes que ganhei durante o período de trabalho não ficavam para mim, viravam propriedade do navio. E se eu não relatasse podia pagar com castigo mais tarde.

— Toda vez que eu desembarcava em algum porto para namorar ou tomar algumas bebidas, para me divertir era obrigado a sair do navio com um camarada me acompanhando. Homem puxa saco do partido comunista. Um dia resolvi que dar um basta na opressão. Tomei umas vodcas a mais e resolvi me desfazer do puxa saco que me acompanhava. Peguei algumas bugigangas pessoais, todo o meu dinheiro e desembarquei aqui. O puxa saco veio junto e começamos a beber, mas ele sempre bebia menos. Retornamos ao Stalin e ao chegarmos perto de uma pilha de pallets, fingi cair no chão.

— Ivanov esse era o nome do puxa saco, veio me ajudar a levantar e teve que usar todas as suas forças para isso, dei lhe uma pancada na cabeça com um toco de pau do pallets. O desgraçado caiu levantou se e parece que nada sentiu  agarrou-se a mim e pediu.

— Igor? Não faça isso.

— Dei lhe outra paulada! Ele balançou ai a coisa já estava feita e tinha que ser terminada. Dei lhe mais uma e vi Ivanov cair de vez. Com a cabeça sangrando, então comecei a correr na direção contraria do Stalin. Por algum tempo me escondi atrás de uns vagões de trem parados dentro do cais. Esperei um tempo para ver se Ivanov acordava, passou uma meia hora e nada. Meu coração começou a bater forte e pensei:- Será que esta morto!  Isso eu não queria amigo.

— E com esse pensamento comecei a andar na direção do corpo do puxa saco! Matar não eu não sou assassino. Isso eu não quero para minha vida. E me abaixei para ver a sua respiração. Ivanov se agarrou a mim blasfemando.

— Eu sabia que você ia voltar Igor, todos voltam para saber se morri. Você é um idiota igual aos outros. Voltou!                                                                                                                                                                       — Já estava de algemas na mão para me algemar! Ai amigo foi que meu sangue subiu e a raiva que eu não tinha sentido antes, tornou se a minha arma. Dei tanto murro na cara do safado que fiz o filho da puta dormir de verdade.

— Ai amigo! Caminhei para a boate ABC House e tomei meu porre na maior tranquilidade. Acabei dormindo na rua aquele dia. E por aqui estou até hoje, nunca mais vou poder voltar para minha terra, lá: fuga é considerado crime.

— E porque você fugia de dois homens de boina preta, no dia que conheceu Ligia! Perguntou Carlinhos a Igor que era o verdadeiro nome do Russo.

— O dia que conheci Ligia eu já estava aqui em Santos há dois anos, trabalhando como estivador. Numa dessas noites o Stalin estava ancorado no cais do armazém dezessete, eu estava por perto e distraidamente acabei chegando bem perto dele para matar as saudades. Infelizmente acabei dando de cara com Vandropov  e Myskar. Que eram tripulantes do navio.                 

— Vandropov era meu amigo mais fiel no navio, tentei conversar com ele, não quis falar comigo, mandou que eu fosse embora ou ajudaria o puxa saco do Myskar a me prender.                                                                                                                                                                                                                           — Dei as costas para ele e sai, nisso Vandro correu para mim e me abraçou. juntos começamos a chorar. Pedi a ele que me acompanhasse a um bar meio escondido para conversarmos e para que ele me falasse de meus pais. E também fazia dois anos que eu não conversava na minha língua com ninguém.

— Ficamos conversando e bebendo essa droga de vodca que eles vendem por aqui e me contaram, que dois dias depois da minha fuga Ivanov morrera no navio e mesmo todo arrebentado me entregou ao comandante.

— Os puxa sacos do partido saíram a minha procura por dois dias, O navio zarpou para o Rio de Janeiro a pior parte do relato de Vandro foi que assim que o navio chegou a minha pátria amada o comandante comunicou a minha, fuga ao partido e mais que eu havia matado Ivanov. Uma semana depois pegaram meus pais e levaram para uma prisão num Lugar chamado Rússia Branca. Um lugar maldito e tão gelado que em uma semana minha mãezinha veio a falecer de frio.

— Os malditos comunistas não podiam ter me castigado desta forma eu amaldiçoei o partido tanto que acabei esmurrando o puxa saco do Myskar. Este por sua vez puxou uma adaga que levava presa a axila e espetou a no meu peito. Rapidamente me levantei e mandei lhe a garrafa de vodca na cabeça e comecei a correr pela rua General Câmara e por duas vezes ouvi  Vandro a me chamar mas não olhei para traz. Só me lembro de ter entrado no bar Love Story e uma moça ter conversado alguma coisa comigo.                                                                                                                                    — Aí amigo acordei no hospital Santa Casa depois de dois dias.                                                                                                                                                                          — Foi assim que conheci Ligia meu amigo ela é minha única família nesta minha terra querida. Hoje faz cinco anos que sou brasileiro e tenho muitos companheiros.   O relato de Igor ou Russo terminou quase na porta do hotel Paulista onde residiam e foram direto para o saguão. Ligia que os vira pela janela chegando, rapidamente desceu as escada e foi correndo encontrá-los e abraçou-se a Carlinhos.

Vendo seu amigo Russo chorando perguntou o porquê!  E este com lágrimas escorrendo pelas faces respondeu:                                                                                               

– Eu estava contando uma história de amor para o meu amigo e a menina dos meus olhos se afogou nas minhas lágrimas. Os três caíram na gargalhada por aquela piada bem contada.  

Aproveitaram e jantaram Igor comentou que há muito tempo não tinha um jantar em família como este que estamos realizando agora.               

Carlinhos assentiu com a cabeça e Ligia disse que estava jantando com o pai e o marido e olhando sorriu para Igor, este novamente deixava escorrer lágrimas dos olhos já vermelhos.                                                                                                                   Carlinhos e Ligia se levantaram e seguiram em direção ao quarto, nas escadas ela lhe disse que os dois se mudariam naquele exato momento. Ele a indagou que mudança é essa! Ela lhe respondeu que o quarto com banheiro dentro tinha ficado vago e que era dela agora!

— Você quer morar junto comigo amor! Perguntou Ligia. 

— Se você quiser por mim esta tudo bem.

E suas bocas sequiosas e sedentas de amor se uniram e os corpos úmidos se atracaram e mais uma noite de amor pairou naquele quarto.

.No dia seguinte Carlinhos acordou com Ligia ajoelhada na cama e olhando para ele. Ela deu lhe um sorriso um bom dia e logo foi perguntando.

— Você me ama?

— Amo!

— Como você pode me amar! Se mal me conhece! E sabes perfeitamente que sou a prostituta do pedaço!

— Dá para amar, uma mulher como eu!

— Ligia! Respondeu Carlinhos É difícil eu dizer, te amo do fundo da minha alma ou do meu ser! Amor não é estar por momentos juntos por horas ou então na cama. Amor não é viver só o que é bonito, curtir o que é bom gostoso e prazeroso. O que posso dizer-lhe, destes momentos que estamos juntos! E te amo nestes bons momentos. Sinto-me bem na sua companhia, adoro ficar com você. Mas um grande o amor. Só o tempo vai dizer.

Ligia saiu do quarto sorrindo e foi ao salão buscar café, mas demorou-se demais e Carlinhos saiu a sua procura.                  

Não a encontrou no salão do bar, porem encontrou Igor já tomando uma vodca!

— Já Russo! Não acha que é cedo para beber!

— Não amigo! Já é tarde. Eu é que levantei cedo.

— Você viu a Ligia!

— Minha menina! Vi sim! Ela deixou este livro para você e dentro dele tem um recado! Carlinhos abriu o livro e num corte da contracapa enfiada uma pequena foto dela e com os dizeres. Amo você e todos os nossos momentos Ligia! Ao repor a foto no corte encontrou um bilhete dizendo.

–- Tome conta de você! Fui para São Paulo, amanhã estarei de volta, te amo Ligia.

Carlinhos acabrunhado fechou o livro, olhou para Igor pediu uma vodca e blasfemou.

 – Que merda Igor! O que ela tanto esconde de mim. Que droga! Porque não falou o que ia fazer. Merda! Porra!                              

E deu um murro no balcão.                                                                                                        

Igor sorriu com cara de garoto maroto e falou.                                                                              

– Aprendeu logo amigo! Carlinhos notando o gesto que fizera começou a rir e Igor riu com ele.


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