Filha única, nunca deu trela aos que os pais diziam,
era revoltada e rica. Tinha um grande amor na vida Jacques. Um estudante de
direito do Largo São Francisco. Um rapaz calmo calado e muito educado.
Um dia o Largo São Francisco estava apinhado de
estudantes e professores em um grande protesto. A manifestação era pacifica o
povo e curiosos que trabalhavam na região central da capital faziam parte da
passeata. O pelotão de choque e a cavalaria da força pública estavam de
prontidão.
O ambiente era tenso os estudantes gritavam palavras
de ordem. ( Caminhando contra o vento), de repente um soldado tropeça na guia
da calçada (sem lenço sem documento), torce o pé e vai ao chão, sua
metralhadora vai ao chão e desliza pela calçada (no sol de quase dezembro). Os
estudantes ao verem a cena evocam uma enorme e animada vaia, o soldado no chão
se põe nervoso.
Jacques! O educado Jacques! Num gesto de piedade e
pena ajuda o soldado a se levantar. A vaia continua. Jacques se abaixa se num
inocente gesto para recolher do chão a metralhadora do soldado.
Ligia grita!
--- Não Jacques!
O soldado que caíra caminha para Jacques, Ligia
corre ao encontro deles. Os manifestantes aumentam a gritaria. Outros soldados
armados correm na mesma direção. Jacques percebe o seu erro. Ligia continua
correndo em sua direção. O soldado que caíra pula em cima de Jacques. Os
estudantes gritam mais alto ainda. Outros soldados correm para eles de todos os
lados. Ouve se um tiro! (Caminhando e cantando somos todos iguais, somos todos
irmãos). Ligia esta quase em cima do corpo do soldado, que agarra a
metralhadora das mãos de Jacques, que larga a metralhadora e leva as mãos ao
peito. Num grito de dor. O soldado cai falseou o corpo com a queda de Jacques.
Ligia desesperada pula em cima do soldado caído a metralhadora espirra fogo.
Outro soldado grita algema ele!
--- Não! Grita Ligia que de repente se vê com a metralhadora nas mãos e
o corpo do soldado caído sobre ela.
O povo continua gritando o corre-corre é geral por
todos os lados. Um tiro de fuzil ecoa o soldado que tentava algemar Jacques
cai. Jacques caído gritava não para Ligia, a emoção e os gestos são mais
fortes. A turba continua correndo e gritando os soldados já estão em cima de
Ligia. A metralhadora engata e Ligia quer de qualquer maneira salvar Jacques e
custe a quem custar. Outro tiro ecoa, uma bomba de efeito moral explode a
metralhadora do meio da fumaça cospe chumbo. As vaias tornam se gritos de
horror. Balas sibilam gente se jogando ao chão, mais ais de dor. A metralhadora
nas mãos de Ligia continua cuspindo
fogo. Balas assassinas espirram sem direção. Ligia deitada ao chão com cara de
terror vê Jacques caído e ensanguentado. Seu dedo instintivamente esta no
gatilho da arma. Ela vê os professores de ciências e direito que socorriam o
senhor Eduardo caírem, Miriam gemeu e foi ao solo. Outra metralhadora responde
ao fogo da primeira. Ligia rodopia o corpo girando e a metralhadora das suas
mãos continua cuspindo balas porcas e sujas e atingem mais um soldado. Rony
cai. João Carlos cai. (Nos quarteis nos ensinam, feliz a canção de morrer pela
paz e viver sem razão). Num de seus rodopios Ligia percebe Jacques em pé e com
o corpo curvado andando a passos arrastados na direção dela.
– Pare Ligia!
Por favor!
Outras balas foram mais certeiras e Ligia vê Jacques
elevar as mãos ao céu e seu corpo subir ao espaço e caindo num baque,
ensanguentado ao chão.
A metralhadora de Ligia para de cuspir é só então
ela se dá conta que esta num campo de batalha e balas de outras armas continuam
sendo cuspidas e sibilam ao seu lado. Gritos,
pedras bombas de fumaça. ( Somos todos iguais, somos todos irmãos).
Alguém
segura no braço de Ligia.
– Vamos garota corre! E
sendo puxada por mais uma mão, correm pela Rua Benjamim Constant para onde
centenas de pessoas também correm. E na esquina com a Praça da Sé um carro
freia bruscamente e Ligia é jogada dentro dele pelas pessoas que a puxavam.
O carro rodou rapidamente em direção a rua XV de
Novembro. Ligia sentiu uma queimação nas costas seu braço esquerdo
.
Então ela grita.
--– Parem! Vamos buscar o Jacques!
--- Vamos buscá-lo... Parem esse car..-. Não teve
tempo de falar mais nada. Seus olhos se fecharam, sua boca secou e ela caiu no
colo de um dos homens que a socorreram. (Vem
vamos embora que esperar não é saber, quem sabe faz a hora não espera
acontecer...).
Um dos homens gritou ao motorista.
– Rápido! Para a clinica!
Na tal clinica Ligia foi operada. Um estilhaço nas costas uma bala no
braço e outra transfixada na parte inferior do pulmão. A menina foi forte e
aguentou bem a pancada.
Já de Jacques não pode se dizer o mesmo sua vida
acabou ali naquele fatídico, onde o seu gesto de pessoa preocupada com o
próximo foi seu maior inimigo nesta vida.
Morreu com quatro balas no corpo de diferentes calibres.
O corpo de Jacques foi recolhido das escadarias da
faculdade de direito do Largo de São Francisco. E levado para o IML. Os jornais
de todo o pais e do mundo deram grandes repercussões ao caso.
A recuperação de Ligia foi rápida, ela foi levada
para um hotel pardieiro na cidade de Santos deixada lá. Aconselharam-na a não
aparecer muito em público e quando a policia politica estivesse por perto, ela
que se fizesse passar por prostituta ou mendiga. E era dessa forma que ela
agia.
Para Ligia Jacques era a paz que ela precisava o
amor a esperança a vida e tudo que ela não tinha em casa.
Quando ela fez quinze anos seus pais se separaram e
esqueceram que tinham uma filha adolescente.
JAQQUES HEROI
Adeus Jacques herói!
Da minha maldita vida,
Minha alma corrói
Por tua partida!
Adeus Jacques, eterno líder.
Do meu coração
Não estas mais comigo!
Partiste, com a ternura dos anjos.
Com o gesto eterno.
De dar a mão ao próximo.
Para você um descanso
Magico e angelical!
Para mim um castigo,
Longo, ardido e difícil!
Até breve amor!
Não demora e nos encontraremos
Santos
1972
Os
amores na mente e as flores no chão. ( Geraldo Vandré). Caminhando contra o
vento, sem lenço, sem documento. ( Caetano Veloso).
***
Ao chegar à tarde do trabalho Carlinhos correu para
o quarto a procura da amada. Nada! Ninguém o esperava. Tomou um banho e desceu
para o saguão do hotel pediu um conhaque e o sorvia a pequenos goles. Ai
pensando na vida lembrou se de Esmeralda. Já fazia algum tempo que não se
lembrava dela ou foi o sabor do conhaque que a trouxe de volta. Acho que foi a
solidão o estado de abandono que sentia ou foi Ligia que a fez esquecê-la. Mas
seja como for ela estava de volta na cabeça de Carlinhos.
Mais alguns goles de conhaque e os olhos verdes de
Esmeralda já o olhavam numa hipnose. Seus olhos parados olhavam para dentro de
sua alma.
O sol se
escondia por traz da serra! O dia ainda claro num resplendor flamejante no céu.
Aos poucos o laranja dourado, tomava conta de toda a paisagem lembrando a mesma
cor dos cabelos de Esmeralda! O sabor doce da boca misturado ao carmim e o
mesmo verde dos olhos nas matas da serra. As cores da amada Esmeralda a sua
menina dourada. Os olhos continuavam parados, como um sonho menino a encantar
lhe a alma. Agora ele não quer mais acordar! Quer tocar o corpo dela, fascínio
que lhe trás a alma a sede de amar. O prazer daquele corpo que exalava vida,
perfumada e estonteante.
Estava bêbado de conhaque e embriagado de amor. E nesse sonho menino!
Carlinhos canta baixinho.
ESMERALDA ALMA E FASCÍNIO
Ao tocar
teu corpo,
Só
beleza, paixão!
Teus olhos, verdes.
Esmeraldas
fascínio!
Que me
trazem na alma
Na alma a sede por teu amor
Quero
penetrar!
O teu
corpo com
Suave
toque de mãos.
Sentir no
aroma do teu corpo
Exalar o ar que respiro
Santos 1972
--- Ei
amigo!
– Há! Sim! Oi olá Igor!
-– Amigo
você esta ai divagando e nem me viu chegar!
--- O que se passa nessa sua cabecinha de
menino! --- Pergunta Igor a
Carlinhos.
-– Nada
Igor só a solidão!
-- Amigo!
Dois dias longe de Ligia e você esta nessa fossa. Isso é uma gamação que pode
te fazer mal.
-– Não
Igor! Minha gamação é por outra mulher.
--– Você tem outra mulher!
--– Sempre tive Igor! Ela mora dentro da minha
cabeça, do meu sangue, no meu olhar em tudo o que faço. Nos meus sonhos e é por
ela que eu vivo. Há anos essa criatura não me larga, não me deixa em paz
-- –
Estou estranhando essa sua conversa amigo! Falou Russo.
--– Não estranha não Igor! Essa garota foi a minha primeira paixão o meu
primeiro e puro amor. A coisa mais linda era de dar a luz à vida. E para tê-la
eu sou capaz de dar minha vida em troca de um simples sorriso para mim.
--–
Amigo! Disse Russo!
--– O que você falou agora é uma das mais
lindas coisas que já ouvi na minha vida. E continuou falando.
--– E
você nunca mais há viu.
— Vê-la
não! Mas procurei-a muito. Com dezessete
anos viajei dois dias em busca de um sorriso dela e só achei amargura.
-— Mas o
que aconteceu! Perguntou russo.
--– Nada
amigo só precisava vê-la! Respondeu Carlinhos.
--- Mudando de assunto onde esta Ligia!
Russo
pigarreou e acabou não respondendo.
--– Sabe
amigo! Eu não quero entrar nesse assunto com você e se alguém tem que te contar
alguma coisa. Esse alguém é ela, a minha menina!
--- Isso
está me constrangendo Russo! Embora eu conheça Ligia há pouco tempo, sinto
falta dela e estamos nos dando bem demais.
--– Isso posso ver nos seus olhos tu não precisas
me falar amigo, mas é melhor a gente ir dormir porque amanhã o trabalho vai ser
difícil.
De fato o fardo de trabalho do dia fora pesado demais e Carlinhos chegou tão cansado que só foi o tempo de jantar tomar banho e cair na cama feito uma pedra que rolou de um barranco.
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