31/12/2018

OUTRA LADEIRA DA VIDA

A ladeira era íngreme; cansava-me subi-la.  Entretanto, o topo – Ah, o topo me deixava maravilhado! – era o céu onde morava minha linda Açucena.  Seus olhos irradiavam sublime luminosidade; sua magia estava no jeito de andar e de gingar o corpo de moleca travessa.

Fiz dos meus braços em volta do seu corpo uma aliança; dei-lhe meu sim por toda a vida como na frente de Deus se dá no altar; dei-lhe carinho, amor e respeito como a uma deusa. Nas manhãs geladas ela me aquecia, sua pele era a seda que eu sentia quando minhas mãos deslizavam atrevidas viajando pelo seu corpo; era a satisfação carnal complementando a do meu espirito.

Sentia-me prisioneiro da enfermidade do meu destino. Açucena me curou aplicando-me injeções de alegria e inventando curativos de sorrisos. Um dia me operou implantando na minha alma um amor avassalador. Vivia um conto de fadas presenteado pelo Senhor da Vida.

Até que um dia minha Açucena colocou para fora os seus espinhos, se transformou em outra flor: uma rosa ainda linda, mas capaz de me ferir. Tal qual uma avalanche de gelo seu desencanto desabou sobre mim e me dei conta de que o nosso colorido amor era ilusão que desbotava com o alvejante do desapego; desencantei-me e virei um desencanto para aquela que eu encantara.

E assim mais um ciclo foi fechado. Talvez pagando dívida que eu trouxe de existências passadas. Entretanto, perante a dor do amor que findou, me amedronta constatar que nesta vida repeti mais uma vez a minha sina.

Triste!...  

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