31/01/2019

PRIMEIROS PASSOS DE UM ESCRITOR

 

A pequena ladeira era de terra batida, socada de pedras para não patinaram os pneus dos carros nos dias de chuva. Haviam poucas casas e muitos terrenos baldios. Éramos a decima família a mudar-se para aquele fim de mundo. Nos sentíamos os colonizadores do local.

Ali cresci e fiz do fim de mundo o meu paraíso. Numa das casas lembro bem morava dona Santinha. Mulher de pouca fala, devia ter seus trinta e poucos anos. Era bonita e tinha a juventude a flor da pele. Era a mãe do meu amiguinho Marcos.

Dona Santinha era uma das poucas mulheres a ter um rádio em casa. As luzes eram de lampião, mas o rádio funcionava a bateria.

Às vezes na parte da tarde eu ia brincar na casa do Marcos. Uma boa desculpa que eu inventava para poder ouvir o tagarela.

LOCUTOR: - E vamos apresentar agora UM PIANO AO CAIR DA TARDE. Música e poesia para sua hora de paz do dia.

Era maravilhoso ouvir o piano tocar entremeado a poesia, aí eu chorava.

LOCUTOR: - Sob o patrocínio de MELHORAL que é melhor e não faz mal. Apresentamos na voz da poetiza Ana Ramos! VERSOS DE AMOR.

Aí vinha uma poesia na voz da mulher que declamava. Como se estivesse vivendo a cena. O piano entrava dando um verdadeiro teatro a poesia.

Um dia dona Santinha me pegou chorando. Veio perguntar-me se eu havia brigado com Marcos, ou estava sentindo alguma dor. Envergonhado respondi-lhe que era por causa da poesia que eu acabara de ouvir.

Ela me disse que o que eu sentia, tinha que passar para o papel. E que quando eu crescesse poderia ser poeta ou talvez escritor. Mas me alertou que eu nunca perdesse o encanto. Eu não sabia bem o que era isso. Mas até hoje quando escrevo lembro das palavras de dona Santinha.

Às vezes eu escrevia coisas bonitas mas achava-as tolas. Mesmo assim guardava meu desenhos, papéis e rabiscos. Outras vezes eu ficava até mais tarde no quintal de dona Santinha escutando o que toda molecada adorava. JERONIMO O JUSTICEIRO DO SERTÃO. Depois vinha a HORA DO BRASIL um falatório enjoado que não acabava nunca. Algumas vezes escutei a novela O DIREITO DE NASCER.

Por vezes escrevi minhas poesias e imitava o locutor da rádio.

Amor menino.

Amor moleque.

Amor divino.

Amor criança a escutar o galo na infância.

Amor das brincadeiras e dos risos.

Das mulheres fofoqueiras

A tagarelar no portão.

Amor de fantasia, de perder o olhar num sonho.

Com a águia a planar.

Procurando no mundo da alegria.

Onde o brinquedo criança! Era a imaginação.

E sob o patrocínio de talco ROSS que refresca e suaviza. Despede-se este locutor que vos fala.

Carlos Alberto Paduan.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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