10/01/2019

CONFISSÕES DE UMA CASA

Adorava ver no meu quintal as crianças correndo nas minhas calçadas. Era uma alegria quando chegavam visitas e caras novas para que eu as conhecesse. Eu as observava e aprendia como gostavam de viver. Gostava de ouvir novas histórias e conversas. Nos quartos, vi, ouvi e assisti a muitos gemidos de amor, muitos deleites e muitos segredos de alcova.

Na sala, muitas conversas fofocas e brigas. Vi as televisões mudarem de  preto e branco para cores e agora em telas planas. Havia muitas festas e músicas; às vezes dançavam. Eu conheci vários tipos de músicas em diferentes épocas. Na cozinha, o odor de vários temperos, mas o que mais me despertava era o de café sendo coado.

Também vi muitas crianças nascerem com seus choros e manhas. Vi pessoas partirem para não mais voltar, deixando seus rostos morarem pendurados em quadros por minhas paredes.
Por aqui houve muitas festas de casamentos, aniversários, natais de sorrisos lindos e anos novos de muitas promessas. Aconcheguei muita gente nos dias de frio e de chuva. Porém, nos últimos tempos  me sentia velha e abandonada, parecendo uma casa mal assombrada:mato crescendo à minha volta, paredes manchadas

***
Em um dia alegre de verão chegou um morador novo de apelido Carlinhos. Um velhinho  simpático que logo foi dizendo que não gosta que de ser chamado de senhor. Logo o vi como um bom amigo. Podou o mato do quintal, lavou e pintou minhas paredes, consertou os buracos do piso, trocou as telhas quebradas e careadas, espalhou flores por toda à minha volta e sempre cura as minhas doenças de mofos e umidades. Iluminou-me!

Foi o único ser que, nestes meus quatrocentos anos de idade, me imaginou falando e percebeu meu sorriso! Agora sim, eu sou uma casa feliz: eu e o Carlinhos passamos as tardes na minha varanda. Ele tomando uma cervejinha ou café, sempre escrevendo suas histórias. Há vezes em que ele conversa com o vento pedindo para que sopre as minhas paredes, tirando a poeira que me incomoda. Outras vezes, me afaga com suas mãos quentes ou encosta seu corpo em mim. Eu sei que isso é carinho.

Então lhe conto todas as histórias que se passaram dentro de mim, desde o dia em que nasci.

Nenhum comentário: