30/05/2018

ESCRITORES E PERSONAGENS


Alguns escritores, quando criam um personagem levam em consideração o que sonharam por toda a vida e nunca conseguiram ter.
Uma mulher descrita como a deusa das deusas, um par de olhos verdes esmeraldas, a boca de biquinho que ao falar formavam duas covinhas nas bochechas vermelhas; os cabelos tinham um tom bem dourado e com milhões de fios de seda cacheados; o nariz fino e arrebitado fazia um curva harmoniosa na delicada face. Foi por essa mulher que o escritor se apaixonou e, como nunca a teve nos braços, deu-lhe vida no seu livro.

Sentado em sua cadeira predileta na varanda, olhava e olhava a paisagem, contemplava no tempo das imaginações a sua musa, um anjo sem asas a correr por entre as árvores e flores do seu fictício jardim.  

Levantou-se da cadeira e foi ao encontro do seu sonho, que já dominava os seus pensamentos como uma realidade. Puxou delicadamente a musa para si e abraçou seu corpo escultural, sentindo seus aromas de amor.

Suas bocas de encontraram, línguas rodopiaram, procurando o desejo e os sabores, as roupas voaram com o vento, colorindo o ar. A boca do escritor desvendou os segredos dos seios, mamilos e ventre da musa. Os suores se fizeram presentes; os beijos, os braços em massagem pelos corpos que caíram a rolar pela grama verde. Seus ventres colaram em ritmo alucinante, frenético.

Explode coração!

O suor do escritor se tornou gelado, sua respiração ofegante. Parecia cansado e com a boca seca, levantou-se da cadeira meio cambaleante. Entrou para a sala da casa. Sua esposa, sentada na cadeira de balanço, notou o abatimento do marido e disse-lhe em tom de alerta.

—Estás pálido de novo?  Melhor procurar um médico

28/05/2018

UM TRASTE QUE ERA ANJO E NÃO SABIA


Estava sempre ali, desde pequeno a amar a vida, as pessoas e a todos de quem gostava. Desde muito cedo apaixonado pelo amor de quem lhe dava atenção. Certa vez, apaixonou-se por uma garota, mas era muito bobinho e sem experiência. Achava que o amor era um conto de fadas. Não conhecia as maldades e os interesses da vida. O pouco que carregava no peito lhe fazia feliz. Amando, seu sorriso vinha de orelha a orelha, era o que bastava na vida. Amando, achava que o sexo no amor era pecado. A alma de anjo predominava dentro dele.

Foi pisado e jogado por esse amor. Como um traste, como um Zé ninguém. Era considerado um idiota. E foi largado num canto como um traste.
Passados alguns anos de sofrimento o traste esqueceu aquele amor. Trancou-o no peito e novamente se apaixonou por outra mulher que o usou e modificou o seu sentir deixando-o mais abrutalhado por sexo. Mais aceso em relação ao amor. Fez o ciúme passar por sua cabeça. Ensinou-lhe o prazer da desconfiança e da deslealdade. Ensinou-lhe a lei de levar vantagem em tudo. E por um beijo de prazer, a vida se tornava a maior felicidade. Tudo em nome do amor do prazer falsificado em forma de luxúria.

O traste se perdeu. Sentiu-se escravo desse amor. E achou que mesmo contra os seus princípios estava sendo e fazendo sua paixão feliz.
E assim se sentiu sempre jogado, como uma maquina que ligavam e desligavam. Quando as mulheres que teve precisavam de amor, sexo e prazer o trastezinho era pau para qualquer hora.

27/05/2018

CAMA QUENTE, MANHÃ GELADA

Num aconchego sem precedentes. Um afago! Um dia diferente.
Uma alegria no coração pela noite anterior. Uma noite de amor tranquila e gostosa. Iluminada como festa no coração e caricia para a alma.
Após a excitação e o êxtase. Carinhos macios com as pontas dos dedos a percorrer, rosto e cabelos. Deslizando suavemente pelos lábios. Os corpos entrelaçados, satisfeitos a sonhar, levitando num sono que vem gostoso. A alma sorri e descansa, repondo as energias há muito esquecidas no tempo.
Pela manhã, o aconchegante calor dos corpos preguiçosos. O quarto na penumbra. Desperta o dia, a manhã é gelada. A alma sorri se contorcendo no prazer da preguiça e felicidade. Os corpos não querem se levantar e se abraçam. A cama esta quente e a manhã gelada. Lá fora o sol acanhado ilumina a geada.
— Bom dia amor! Diz Carlinhos à sua amada.
— Vamos! Temos que acordar deste conto de fadas.

26/05/2018

FAZ-ME SONHAR


Faz-me sonhar olhando nos meus olhos, expressando o quanto me desejas. Mas não deixes que eu me convença disso, pois assim tu me conquistarias.

Faz-me sonhar, sorrindo teu sorriso mais encantador. Dando a entender que sorrindo, tendes paixão por mim. Mas não deixes que eu entenda desta forma, pois assim tu me conquistarias.

Faz-me sonhar, me abraçando com toda a força do teu sentir. Mas não deixes que eu sinta o teu coração bater forte. Poia assim tu me conquistarias.

Deixa-me sonhar só pela tua presença. Mas não deixes transparecer que me amas. Assim continuo com meu sonho de conquistá-la. Isso enche minha alma de emoção e felicidade. 

Num desejo de tê-la para sempre dentro de mim.

24/05/2018

A NEGA MARIA


Ali estava o negrinho Odorico de frente à sua mãe, a velha Maria, que lhe pergunta:
— É isso que você quer menino?
Odorico assentiu com a cabeça. Maria colocou a pequena trouxa com algumas peças de roupa, uns pedaços de pão e rapadura nas mãos do filho.
As lágrimas do pequeno eram de alegria e a mesmo tempo de tristeza... Saíram porta afora do velho trapiche adaptado para moradia que ainda cheirava a cachaça. Com o dedo em riste, mostrou o caminho para o filho.
A voz da velha era doída, mas com a sabedoria de quem aprendera com os Orixás, disse ao menino:

— Vai menino! Aquele é teu caminho e só volte no dia em que achar o teu sonho. E quando encontrá-lo, venha dividir comigo seu prêmio, por eu ter confiado em você!

Odorico partiu com o vento zunindo nas costas. No fim da trilha, olhou para trás à procura da mãe. Não viu nada.

22/05/2018

MEU TEMPO COM O VENTO

Desde criança, eu ainda novinho, tu vinhas em redemoinhos pelas ruas de terras poeirentas na pequena e doce ladeira da rua onde eu nasci. Levantavas o pó para que eu entrasse dentro de ti! Ali tu me abraçavas. Eu ria com a boca e os olhos cheios de poeira e folhas secas, que voavam feito um bando de borboletas a brincar. Tu me afagavas soprando em meus ouvidos. O tempo passou e nosso pacto de amizade sempre prevaleceu. Às vezes, na minha varanda, ouço o tilintar dos sinos de vento, que lá instalei para tu tocares quando sentires saudades de música.

Outras vezes, quando estou distraído, tu me chamas a atenção derrubando alguma coisa. Sei que estás me chamando. E nessa hora sempre te pergunto:
— Como vais meu amigo! Queres alguma coisa? Já sei, queres brincar comigo.

Então, para te deixar sorridente, pego a vassoura e vou varrer as folhas do terreiro.
Varro para um lado e tu sopras para o outro. Às vezes tu me deixas fazer alguns montinhos de folhas. Quando vou buscar a pá para recolhê-las - “Que bom”! - Tu as assopras. E um bando de borboletas faz a alegria das nossas brincadeiras.

Parece que neste mundo só nosso não passam outras pessoas. E se passam, poucas te percebem. Poucas te sentem como a brisa gostosa e cheirosa, que seca e afaga nossos suores no dia de sol quente. Sei que às vezes tu te enfureces e devastas. Fico triste , mas se acontece com as pessoas, é porque mexeram com tua mãe Natureza.

Quero continuar a brincar contigo neste mundo cheios de sonhos. Só te peço, no dia em  que jogarem as minhas cinzas no meu jardim de orquídeas, que tu venhas em redemoinhos e junte minhas cinzas à tua poeira. Assim, selaremos nosso pacto e viajaremos pelo mundo como irmãos gémeos que sempre fomos.

21/05/2018

OS VELHOS, AS FLORES E A HORTA

Aposentado!
Num canto jogado,
olhos fixos em nada, parados.
Em prantos, imaginando o que fazer.
Sem prazer!
Era assim todos os dias
em caminhadas de  manhã quente.
Ensolaradas!
Passo fraco pela calçada, cuidando para não cair,
notou nas rachaduras de um muro pequena flor.
Amarela!
Uma criança passou arrancando,
decepando o encanto da bela.
 A florir!
Em casa, corpo cansado, almoço à mesa, feijão e arroz.
Que beleza!
Batata e ovo estrelado, farofa de toucinho, quiabo bem babado,
laranja azeda de sobremesa,
mal escolhida com certeza!
À tarde, um passeio pelo quintal. Muito mato, erva daninha, puro matagal. Nenhuma planta bonitinha, amarelinha como a florzinha da rachadura do muro. Capim gordura, capim cidreira, capim cidrão, mas só para chá. Tinha caruru, que é comida de galinha, porém ali não tinha galinha. Naquele quintal, só capim, capinzinho, capinzão e a venenosa maria-pretinha, nada de bom. Terra largada, sem valor, que não prestava para nada.
No dia seguinte levantou cedo, tomou café ralo e amargoso e foi pôr em prática o sonho que sonhou: foi na venda e comprou pá, enxada e um balde para  terra. Não esqueceu de um carrinho de mão. Em

DIA DO CASAMENTO

Era o dia do casamento.
Mércia, a noiva, estava muito preocupada. As amigas davam os últimos retoques em seu chique, porém simples, vestido amarelo que fazia realçar sua cútis morena, mas combinava com seus cabelos curtos e tingidos de loiro.
Estava tudo pronto. Uma casa simples nada de pompa. Alguns convidados, amigos e vizinhos se faziam presentes. Porém o desejo de Mércia era a maquiagem e os cabelos penteados. Faltando apenas uma hora para cerimônia, a noiva Mércia, além de muito nervosa, entra em pânico. O choro lhe vem da alma. Chegara a notícia que a maquiadora e o cabeleireiro, haviam sofrido um acidente no percurso, não chegariam a tempo para deixá-la linda como ela desejava.

Do outro lado, o noivo Carlinhos, acabava de se vestir. Com um sapato do tipo mocassim marrom, uma bermuda combinando e uma camisa branca com algumas rendas enfeitando-a. No bolso, um lenço bege aberto em forma de flor.

Carlinhos ficou sabendo do desespero da amada com a maquiagem e foi ter com ela que, desconsolada, chorava muito.

— Meu amor como vou me casar com os cabelos deste jeito.

Ele, num sorriso terno e confortante beijou-a na face e abraçou-a com ternura, dizendo em seu ouvindo:

O DIA EM QUE PERDI MINHA INFÂNCIA

As malas estavam arrumadas. Olhei para as quatro paredes do meu quarto pintadas de verde-claro caiado, com manchas verdes mais escuras onde havia umidade. O cheiro, quem vinha de fora achava que era mofo, mas não era; era o cheiro do meu lar, de uma casa gostosa, cheiro de uma infância feliz que estava começando a ficar para trás. A sala era caiada de amarelinho e, no canto, um armário de vidro com madeira entalhada. Do jogo de sofás, só me lembro da cor: um azul pálido.
Porta afora, um corredor comprido que chamavam de “área” com o chão de cimento e vermelhão, gasto onde pisavam. No final dele, quatro degraus de escada levavam a um pequeno quintal à frente da casa com um gramado onde eu costumava me deitar para escrever sobre o amor. Sobre o meu amor, que se chamava Esmeralda!

Finalmente, o portão da entrada que me libertava para a rua. Muitas vezes, carregava uma varinha na mão raspando na cerca ripada fazendo barulho, procurando notas musicais no som do trec-trec-trec Minha saudosa ladeira não era íngreme, permitia jogar futebol, bolinhas de gude e mana-mula. As meninas pulavam corda ou cantavam de mãos dadas nas brincadeiras de roda. Encantavam o horizonte os sóis da manhã, da tarde e do final do dia. Quando se escondia atrás dos morros, lá longe, as casas pareciam bem pequeninas com seus telhados avermelhados se assemelhando a miniaturas de vilas de brinquedo.

Com a mala na mão, pronto para a partida, olhei para a rua abaixo, havia umas dez casas de cada lado. Em uma delas, lá estava minha namoradinha no portão olhando ladeira acima me dando adeus com um aceno de mão. Não suportei aquele momento. Minha meiguinha e bonitinha se despedindo

UMA MENINA ESPERTA

A vida é muito estranha, mas também muito gostosa de ser vivida. Foi o que aconteceu com Carlinhos, velho e com a idade avançada, apaixonou-se pela antiga namorada de colégio.
Era uma linda garota de cabelos negros e compridos, um corpo escultural de parar transatlântico no píer. Tinha olhos matreiros e penetrantes de sensualidade.
A morena hoje na mesma idade de Carlinhos, também esta apaixonada por ele, então como dizia meu avô. Juntou a fome com a vontade de comer. Mesmo longe da amada, Carlinhos há suspira, por todos os cantos onde anda. Sonha muito, sente ela colada nele, dia e noite. Hoje pela manhã foi inédito o que aconteceu no supermercado. Na fila do pão, nosso personagem pediu seis médias ( Aqui em Santos, média é um pão francês ou um pãozinho ). E no seu divagar com a amada, não escutou quando a menina do balcão, lhe mostrava as médias e dizia que estavam pequenas e se estava bom o tamanho. Carlinhos não ouviu e nem viu isso.
A outra menina esperta, muito simpática e sorridente com todos, tirou Carlinhos do seu sonho dizendo.
— O senhor não escutou? Esta apaixonado, pensando na namorada!
Carlinhos caiu em si e respondeu-lhe de pronto.
— Como você sabe disso menina!
— O senhor não escutou minha colega falar e seus olhos estavam parados! Sinal que o senhor estava sonhando com a namorada né!
— Verdade menina esperta! Na minha idade é muito bem sonhar, amar e ficar apaixonado como estou agora!
Algumas pessoas na fila se manifestaram pelas palavras do velho. A menina esperta sorriu e lhe desejou felicidades. Uma senhora atrás dele disse.
— Eu me sinto assim todos os dias, também estou apaixonada! É muito gostoso.
Carlinhos agradeceu as meninas do balcão, deu um sorriso de satisfação à senhora pelo comentário e continuou mais feliz ainda. Fazendo o resto das compras com a amada ao seu lado.

FÁBRICA DE POESIAS

Um homem que se pensava poeta
tentou realizar uma fantasia,
achando ser a coisa certa:
 Uma fábrica de poesia!
Presa do romantismo, tentou ele se expressar.
Porém...
 lhe faltava inspiração para começar.

Convidou os mestres para consagrar sua ode poética.
Na primeira poesia visitou de uma mulher a anatomia
bela e singela.
 Quem, com corpo elegante e expressão insinuante, seria ela,
a musa do amor perfeito?
Donzela!

Poema e mulher já nasciam com o defeito,
pois não entendia o conceito
da ode, poesia, canto e soneto.
 Rima pobre e indelicada,
coisa sem sal, aguada.
 Fazia mal
para a pressão arterial
para quem escrevia
e lia.


À mesa redonda convidou alguns poetas para se inspirar na criação.
Pediu licença para quem não estava,
E, quem sabe faltando à ética,
escreveu crônica rimada acreditando não ferir a estética.

UM ESCRITOR ABORRECENTE E ABORRECIDO

Sempre tive o sonho de escrever um livro, mas nunca tive ânimo para fazê-lo. Depois que me aposentei, a minha vida, que já era chata, ficou pior ainda. Então, resolvi começar a escrever.
Concebi a história de um menino, suas aventuras e recordações da sua infância. Dei os primeiros passos na escrita e devagarinho fui tomando gosto pela coisa e, catando milho no teclado do computador, cá estou eu, trazendo a história do menino que sou eu mesmo.
De repente o telefone toca.  Paro de escrever. Pronto, já perdi minha concentração e atendo a pessoa com pouco-caso, querendo logo despachar. Era alguém me perguntando se eu não queria ajudar o Lar dos Velhos Desamparados. Respondi que também era um...
Volto para o computador e... caramba, perdi o fio da meada! Desligo a máquina e, aborrecido, vou tomar um café. Fico aos golinhos, sorvendo o caldo ralo que minha mulher faz, e vou pensando. Na minha cabeça entra de novo a história do menino e volto correndo para o computador. Começo a me deliciar com os beijos da minha namoradinha, seu sorriso puro que enchia meu peito de paixão.
-- Carlinhos eu te amo. Diz ela.
-- Eu também te amo, minha linda.

A CHAMA QUE NÃO SE APAGA

Levantou-se com o sol raiando e pensou: "Maravilhoso será este dia".

Olhou para o lado e disse:
— Bom dia meu amor. Foi para a cozinha, acendeu o fogo. Logo, o cheiro da lenha queimando invadiu o ambiente. Enquanto o café coava, foi para o banho. Embaixo do chuveiro cantou algumas melodias felizes. Revigorado e se sentindo cheio de energia voltou ao quarto. Tirou a toalha que o embalava do nu. Enquanto colocava uma roupa limpa, seu amor sorria. Pegou-a com ternura beijando-lhe a face,depois a levou para uma pequena área avarandada onde estava posta a mesa do café.

Tomaram o café em silêncio como faziam há muitos anos, ela sempre sorrindo, ele sempre a admirando.

Após o café,  disse à amada que aguardasse um pouco, pois enquanto ele cuidava da criação, ela podia apreciar os verdes jardins e as novas rosas que se abriram na soleira da área.

Quando voltou,  pegou-a novamente com carinho abraçando-a contra seu peito. Nesse momento uma pequena lágrima escorreu.

Beijou-a novamente na face. Já no quarto, disse-lhe que voltava na hora do almoço. E ali no criado-mudo depositou com delicadeza o porta-retratos.

Com a foto sorridente da amada que partiu prematuramente.